segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

um bom ano

O próximo ano está quase chegando. Tudo bem, a frase foi só um cliché, uma tentativa de não cair no lugar ainda mais comum do Tim Maia: "Mais um ano se passou". Só que é a verdade e acho que por mais criativo que eu seja, não existe outra forma de começar a falar sobre tudo que aconteceu, sobre mais um ciclo que se encerra. Um ciclo, sim. Por alguma convenção cármica, religiosa, que vem lá dos primórdios, quando alguém decidiu dividir o tempo dessa forma. Mais um ano se passou.

Foi o ano mais rico da minha vida. Isso eu posso falar assim, de cara, sem dúvida nenhuma. Eu nunca passei por tantas coisas, boas e ruins, nos ciclos anteriores. Houve 1999, mas foi diferente da música do Prince. Meu pai morreu. De repente, sem avisar. Foi morto, na verdade, mas isso não faz muita diferença. Nunca fez. O fato é que se foi. Porrada na cara. Eu me lembro muito do ano 2000, meu "day after". Com 17 anos, cara limpa, tentando encarar a vida de frente. O que você vai ser quando crescer?

Eu não percebi que eu ainda tinha que crescer. Que eu ainda podia crescer, que eu ainda devia que ser filho, ainda que só da minha mãe, com todas as dificuldades que isso pudesse representar. Não. Eu não tinha que assumir nada, não tinha que esquecer do meu amor pela arte, pela vida. Não tinha que pensar na segurança, nas contas, não tinha que ser pai de porra nenhuma. Mas foi exatamente isso que eu fiz.

Até que depois de algum tempo, tive 2005 e 2006. Foda. Acabar a faculdade, ajudar a construir o sonho do escritório - em que eu era estagiário, mas assumi como se dono fosse - o famigerado exame da OAB, trabalho de conclusão. E no meio disso tudo a Camila. Aproveitava todos os bons momentos e me esforçava pra fingir ser alguma outra coisa diferente, boa para ela, nos meus momentos ruins. Tudo medo. De perder alguém que, na verdade, eu sequer tinha conhecido. Ela não foi a mulher da minha vida. Mas com certeza foi quem me fez acreditar nesse mito pela primeira vez.

Tudo isso pra chegar em 2008 e tentar explicar porque, mesmo com todas essas coisas que falei dos anos anteriores, este ano foi o mais maluco e o mais rico de todos. Eu vou me lembrar dele pra sempre, e não por um ou dois detalhes ou acontecimentos marcantes, mas por um monte deles. Aqui, finalmente, eu me vi como eu sou. Eu sempre tinha me encarado como um prédio em construção. Em 2008 eu pensei um pouco em mim como um prédio precisando de reformas.

O que eu to tentando dizer é que, de alguma forma, eu não olhava para o presente. A minha visão estava sempre lá, no futuro. A minha felicidade estava sempre lá, adiante. Os meus objetivos, as minhas metas, os meus planos, eram todos da minha família feliz quando eu tiver 40 ou 50 anos de idade. A minha viagem ideal não era o meu reveillon desse ano ou o carnaval do ano que vem. Era alguma foto de cartão postal, em algum ano distante do futuro feliz.

Mas em 2008 não! Nesse ano eu me dei esses prazeres. Muitas vezes o meu dia legal foi hoje, a minha viagem bacana foi o próximo feriado, a minha refeição perfeita foi aquela que eu estava fazendo, naquele exato minuto! Eu não menosprezei isso por nenhum instante, não achei que aqueles prazeres eram pequenos perto dos meus planos mirabolantes, dos meus ideais, dos meus sonhos.

Mas muitas outras vezes, o hoje foi uma merda imensa. Um emaranhado de problemas, de dívidas, de obstáculos, de solidão, de medo. Mas eu lutei. Não me permiti sonhar, não. Levei tudo isso no peito. Toda a insatisfação, o desgosto, as incertezas. Eu me dei todas essas dores, assim como me dei todos os prazeres. E com isso encontrei todas as minhas fraquezas. Todas as coisas que me faziam fugir da dor do presente para um bem estar utópico, num futuro que ainda não existe.

Consegui perceber quando estou tranquilo, quando estou eufórico, quando estou depressivo. E consegui entender, na maior parte das vezes, a razão de todos esses momentos acontecerem. Fui quem eu sou. Com muito medo, sim, mas fui quem eu sou. E vivi. Consegui romper algumas barreiras e expor melhor as minhas virtudes e as minhas limitações. Ganhei ainda mais respeito e reconhecimento. Responsabilidades, também. Fui conquistador, ousado, muitas vezes eufórico, outras vezes depressivo.

Vivi intensamente as amizades, os romances, as responsabilidades, os sucessos e os fracassos. E paguei as contas assim: a da euforia com cheque especial, a da depressão com terapia. Hoje eu acho que estou livre da euforia e da depressão, mas o cheque especial e a terapia persistem. Só que com consciência. De um jeito diferente. Mais presente, mais real, mais verdadeiro. Eu honestamente não sei onde isso vai dar, mas a grande mágica disso tudo é que estou começando a perceber que, de fato, eu não preciso saber. Eu não devo saber, não devo imaginar. Só quero viver cada dia da melhor forma que eu puder.

E assim, como não poderia deixar de ser em toda grande história, encontrei uma grande paixão. Alguém com quem eu pude dividir toda a alegria do momento presente, com quem eu fui feliz dançando sozinho na festa, cantando sozinho na balada vazia. Alguém com quem eu tive prazer - e que teve prazer comigo - em assaltar a geladeira já quase no começo da manhã.

Tudo o que nos uniu, tudo o que me fez ver tanto brilho naqueles olhos, tanta graça naquele sorriso, tanta vida e tanto encanto naqueles gestos, foi uma coisa só: a verdade. Tão intensa e ao mesmo tempo tão simples como só a verdade pode ser. Com ela, eu nunca fui pra onde eu não quis ir, eu nunca vesti o que eu não me sinto confortável em vestir, eu nunca comprei o que eu não podia pagar. E mesmo assim, eu não me lembro de ter dado tanto de mim para nenhuma outra pessoa.

Também não me lembro de ter tido tanto medo, como eu tenho agora, de que o que eu sou pode não ser o bastante para tê-la ao meu lado. Mas hoje eu sei que viver consciente implica em conviver com essas dúvidas e eu decidi escolher a consciência, com todos os medos e incertezas que ela pode trazer. Não está sendo nada fácil, mas é o meu novo caminho - o único caminho - e eu estou profundamente, verdadeiramente, comprometido com ele.

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